Rachel Callai Bragatto
Membro do Coletivo Soylocoporti e da equipe Kuai Tema
Entre os dias 1 e 3 de dezembro acontecerá a I Conferência Nacional de Comunicação. A convocação pelo presidente Lula, mesmo que tardia, é um fato a ser comemorado pelos movimentos sociais e entidades que buscam uma maior democratização do setor e do país. Espera-se que com este evento possam ser discutidos temas centrais para a efetivação de parte das mudanças necessárias para o país.
Devemos ter na pauta questões como a imagem da mulher na mídia, a homofobia e o preconceito propagados pelos meios de comunicação de massa. Aguarda-se ainda o debate sobre o monopólio das concessões de rádio e televisão, a implementação do sistema público de comunicação, a universalização da Internet e da banda larga, a digitalização da TV e do rádio e a consequente migração dos canais analógicos para os digitais, além da entrada das teles no mercado de produção de conteúdo e a necessária regulamentação do setor.
Será, portanto, um momento em que as pautas políticas dos diferentes setores que compõem a sociedade brasileira poderão ser colocadas e defendidas, procurando incidir na definição das políticas públicas e na legislação brasileira.
Nesse sentido, avalia-se que para garantir as mudanças que julgamos fundamentais será necessária articulação e coesão do campo progressista e popular. Sem dúvidas, temos condições de construir um programa mínimo comum e, assim, fazer a defesa conjunta dos interesses difusos que fazem parte das mais diversas lutas.
O Coletivo Soylocoporti compreende que sua função nesse debate é contribuir para a construção de políticas que levem em conta a complementariedade da comunicação e da cultura – buscando a multiplicação dos atores envolvidos e a diversidade das idéias propagadas.
Nos atendo ao artigo 221 da Constituição Brasileira, concluíremos que as emissoras de rádio e TV devem buscar, preferencialmente, finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, promovendo a cultura nacional e regional e estimulando a produção independente.
Porém, por que isso não ocorre? Por que um princípio contitucional, previsto em nossa carta magna, é desobedecido diariamente na maioria das emissoras comerciais?
A resposta é, ao mesmo tempo, muito simples e muito complexa. Por um lado, podemos dizer que o que falta é a regulamentação do princípio. Dessa forma, precisamos responder a questões como: que regulamentação queremos? Em qual sentido apontaremos? E, portanto, o que é produção regional? O que é produção independente? Como medir se um programa tem finalidades culturais? Quanto de produção regional e independente devemos ter?
Nesse debate entram, é lógico, fatores econômicos e o desafio político que é mexer com os barões da mídia corporativa nacional e mudar as regras do jogo. Regulamentar este princípio de forma progressista é garantir espaço para muitos produtores e produtoras que são diariamente escanteados e cujo trabalho não alcança visibilidade pública. Significa alterarmos a relação de forças e darmos voz à outras produções, a atores que tem o que dizer mas não conseguem veicular suas manifestações.
Além disso, por outro lado, devemos nos questionar que tipo de produção iremos publicizar ao conseguirmos esse espaço. Não é apenas uma questão política, mas um aspecto que diz respeito ao formato que adotaremos. Isto é, ao alcançarmos a esfera da visibilidade pública, de que forma exporemos nossas idéias? Como nos comunicaremos? Iremos adotar os mesmos padrões utilizados hoje em dia ou acreditamos que a cultura tem diversas formas de expressão e que precisamos nos valer delas?
Sendo assim, compreendemos que cabe aos movimentos culturais buscar essas formas e trazê-las à luz. É preciso que mostremos que temos condições de nos apropriar dos meios de comunicação e que temos o que dizer, tanto nos formatos tradicionais quanto em formatos novos, provocadores, inusitados. Já o movimento de comunicação precisa se voltar para esse debate mais técnico, lutando para que possamos incidir, de fato, na produção regional e independente, garantindo a regulamentação necessária para uma real efetivação desses aspectos.
É uma luta de mão dupla e apenas juntos podemos avançar. O Soylocoporti segurirá contribuindo nesse sentido. Cabe aos movimentos e entidades que ainda não despertaram para esse momento histórico virem se somar ao processo, trazendo suas idéias, propostas e contribuições. É a hora de fortalecermos nossa plataforma política mínima para a I Conferência Nacional de Comunicação, acumulando propostas e desenhando a mídia que queremos ver nesse país e a cultura diversa que deve ser propagada!